Mulher, negra e de origem humilde. Foi assim que Isabel Cristina cresceu, estudou, exerceu a profissão de professora e depois entrou para o mundo da política, de onde não quis mais sair. Neste sábado (29) o Blog Vinicius de Santana tem o prazer de publicar essa entrevista especial com a primeira vice-prefeita de Petrolina, ex- superintendente da Codevasf, ex-vereadora e atual deputada estadual, já no seu segundo mandato pelo Partido dos Trabalhadores (PT). Reconhecida por romper muitos tabus, hoje essa petrolinense, que é a única mulher sertaneja na Assembleia Legislativa, celebra os seus 60 anos de lutas contra as desigualdades sociais. Confira mais essa entrevista exclusiva do blog.
A mulher que quebra tabus
“Fui premiada no sentido de ter tido as oportunidades, sobretudo nessas questões dos espaços da mulher. Em Petrolina, fui a primeira vice-prefeita, mas não fui vice-prefeita com cabeça de homem, a diferença é essa. Tem muitas mulheres que são prefeitas, ocupam os espaços, mas ficam com a cabeça no conservadorismo da política nacional. É preciso ser mulher com a cabeça de mulher para promover as mudanças, a partir do olhar feminino. Então, fui premiada por ser a primeira vice-prefeita da cidade e com mais alguns adjetivos que incorporam a desigualdade como, por exemplo, ser negra, pobre, características que determinam as classes mais discriminadas do país e isso é motivo de muito orgulho. Fui também a primeira mulher a assumir uma empresa federal em Petrolina, a Codevasf. Enfrentei todo aquele preconceito, tanto racial como de gênero, a ponto de, por exemplo, pela primeira vez, admitir no quadro da empresa uma vigilante. Aquilo causou um horror às pessoas que receberam aquilo, talvez até como uma afronta. Depois fui a primeira mulher do Sertão a chegar na Assembleia Legislativa de Pernambuco. E eu, realmente, me sinto premiada porque eu achava que tudo isso era impossível pra mim por ser negra, pobre e por ser mulher. E ser deputada e ser mulher é uma responsabilidade porque eu tenho que trazer para o meu mandato o combate às desigualdades para os menos favorecidos. Por isso, o meu mandato é voltado para aqueles que precisam. Os burgueses, as elites não precisam do meu mandato.”
 |
| Deputada Isabel Cristina sempre ao lado dos trabalhadores |
Movimento nas ruas do Brasil
“Esse movimento iniciou-se de forma atípica. Primeiro pelos R$ 0,20 da passagem e, em seguida, ele foi ampliado, com a ajuda da TV Globo, sem dúvida nenhuma. A emissora tem uma intenção clara, as elites do poder econômico não aceitam um partido como o nosso governar por 10 anos, por mais dois, por mais quatro anos. Então, de repente, ela [a TV] tenta passar para a população a imagem de que a própria população cansou do governo, mesmo a população tendo reconhecido os avanços que ocorreram no país nos últimos 10 anos. Aqui na região mesmo, quem imaginaria que seria possível a chegada de uma universidade federal. Mas, essa juventude está encontrando tudo isso. Essa juventude que está nas ruas não conheceu a Ditadura Militar. Então, é importante que ela vá para as ruas mesmo, retome essa luta, mas que retome com cuidado, sob pena de virar um movimento fascista e de ser “englobado” como um movimento anti-Dilma. Não é contra Dilma, nem contra o PT, é um movimento que me parece estrutural para a política brasileira. A juventude está querendo algo que, eu também quero. É o combate a corrupção, é a insatisfação com a impunidade, é a diminuição dessa carga tributária.”
Deputada Isabel Cristina em recente encontro com lideranças politicas e com o Governador Eduardo Campos
Lutas
“Com todos os avanços do nosso governo não conseguimos acabar com a corrupção, nem com o vício da barganha, que está no Congresso Nacional. Esse movimento apontou para a reforma política e, se houver uma imensa maioria nas ruas, essa reforma vai ter que sair com as mudanças estruturais que a gente defende, como por exemplo, o financiamento público de campanha para evitar essa farra de candidatos que, de forma desigual, disputam a eleição. Eu, por exemplo, disputo com tostão diante daqueles que disputam com milhão. E isso faz com que a sociedade deixe de ter representantes legítimos, que possam avançar e estar preocupados com a mudança de vida das pessoas.”
PT na bancada de Julio Lossio?
“Isso nasceu da própria mídia de Petrolina, onde muitos veículos se assemelham a Globo. Há os interesses de determinados setores de imprensa e até interesses individuais de alguns profissionais. Assim, são geradas especulações e é natural que as pessoas fiquem em dúvida mesmo. Então, quem é Julio Lossio? Ele é o prefeito da cidade. O que o PT tem haver com isso? O partido tem dois vereadores na Câmara que têm a responsabilidade de legislar em favor da população e têm a responsabilidade de estar atentos a tudo que ocorre. Então, será que tudo que o prefeito faz está errado? É esse o divisor que a gente tem que fazer. Quem é governo é governo, quem é oposição é oposição, mas quando você vai para a rua pedir um voto, você não diz que vai ser contra a tudo que for para o crescimento de Petrolina. Então, o diálogo com o prefeito é possível sem se render. E eu inclusive tive a oportunidade, como presidente do PT de Petrolina, de conversar com Julio Lossio. Claro que ele tem interesse em agregar o maior número de partidos na sua base e nós recebemos propostas nesse sentido. Mas o PT, cautelosamente, como sempre fez, respeitando inclusive a sua base política, disse não. Politicamente nós vamos poder, onde for possível, apoiar os projetos e quando não for possível, vamos votar contra. Nesse momento, alguns grupos maldosos tentam imprimir essa marca do PT junto ao governo [municipal], mesmo sabendo que não é verdade. Mesmo sabendo que não temos cargo no governo, mesmo sabendo que nós somos independentes. Tudo isso porque, agora, nós não somos radicais como eles queriam.
Fernando Bezerra Coelho no PT?
“Como ele [FBC] está no governo com toda essa crise, onde o nosso governador se coloca como pré-candidato à presidência e o Fernando, que tem uma ligação forte com Eduardo Campos, está exatamente no governo como um dos melhores ministros, então a gente não sabe se realmente nós vamos ter o PSB na nossa base. Lembre que foi construída uma frente política para governar o Brasil. Já em Pernambuco nós fazemos parte do governo e temos dado todo o apoio necessário para que ele [Eduardo Campos] governe. Veja que é uma frente que tem dando resultado. A gente ainda torce que essa frente se mantenha. Que o ministro permaneça no governo ajudando a governar, ajudando a região [Sertão/Vale do São Francisco], porque ele tem uma dedicação muito especial à região. Agora, se isso não for possível, não é de descartar que Fernando Bezerra seja candidato a governador, não sei se no PT, mas em outro partido aliado. Se isso for decidido, é claro que o PT vai abraçar.”
Deputada Isabel Cristina na Tribuna da Assembleia Legislativa
O Sertão está mais fraco politicamente em Pernambuco?
“Nós precisamos de uma bancada federal, porque ela tem muita importância, pois os recursos são maiores. Em nível estadual também, mas é bem diferente. Geralmente as emendas são poucas. Então, não é que o Sertão perdeu força, é que o momento político é outro. As coisas estão acontecendo. E mesmo com toda a força política que esse Sertão já teve, nunca se construiu a quantidade de casas como estão sendo construídas hoje. Quantas pessoas passaram a vida inteira para conseguir comprar um veículo usado. Hoje é mais fácil comprar um carro zero Km, financiar… É claro que a força é de cada momento, depende da conjuntura política.”
Deputada Isabel Cristina laureada na festa dos destaques do colunista Gileno
Superação
“No período do meu primeiro mandato de deputada, em 2008, realmente eu tive dificuldades. Quando eu descobri a doença, passei um certo momento de ‘quarentena’ fazendo um tratamento e isso me debilitou um pouco pela minha ausência na política, que eu já incorporei como uma função de vida. Agora, hoje eu estou bem, continuo ainda em tratamento por que ele não encerra, porém eu estou com toda a minha disposição de trabalho. Tenho viajado bastante, tenho exercido meu mandato de forma muito dinâmica.”
Pronta para 2014?
“Com certeza! Até porque a lógica da política é a seguinte: você dedica uma boa parte da sua vida a um projeto e esse projeto não finaliza. Ele sempre está inacabado. Então, eu dediquei a minha juventude inteira na luta para mudar o Brasil num viés da classe popular. Nós estamos do lado mais forte na quantidade e ao mesmo tempo mais frágil, no sentido da estrutura para enfrentar os processos políticos. E, de repente, nós conseguimos em Petrolina, que era uma cidade extremamente fechada diante de um núcleo político, mas com a luta, as movimentações e organizações da sociedade, chegar à Câmara de Vereadores sem a mínima estrutura financeira. Nós conseguimos passar a nossa proposta a ponto de termos chegado à vice-prefeitura. O nosso partido com toda essa ideologia, todo esse sentimento de mudança nos ajudou. E nós chegamos à Assembleia [Legislativa] e estamos no segundo mandato da suplência, é bom deixar claro, porque ainda não conseguimos eleger um mandato próprio. Então, fica sempre algo que precisa ser dado continuidade. Não é por uma questão de estar no poder, ou estar deputada. É porque eu acredito muito que ainda podemos fazer bastante para ajudar a alterar esse quadro, que hoje já causa insatisfação diante da população que está nas ruas.”
Blog do Vinicius de Santana
Nenhum comentário:
Postar um comentário